A Cidadania do Cristão

“Não importa o que aconteça, exerçam a sua cidadania de maneira digna do evangelho de Cristo, para que assim, quer eu vá e os veja, quer apenas ouça a seu respeito em minha ausência, fique eu sabendo que vocês permanecem firmes num só espírito, lutando unânimes pela fé evangélica, sem de forma alguma deixar-se intimidar por aqueles que se opõem a vocês. Para eles isso é sinal de destruição, mas para vocês de salvação, e isso da parte de Deus.” (Filipenses 1.27-28 – NVI)



        Paulo, em Filipenses 1.27, exorta a igreja a exercer “a sua cidadania de maneira digna do evangelho de Cristo”. Algumas traduções para o português não utilizam o termo “cidadania”, traduzindo o verbo grego πολιτευομαι (politeuomai) pelo termo “viver” em sua forma imperativa: Vivei… de modo digno do evangelho” (ARA). Porém, este verbo é relacionado à política e significa “ter um comportamento condizente com sua condição de cidadão”[1]. Portanto, Paulo aqui está preocupado com a cidadania do Cristão. Mas de que cidadania o texto está nos falando? Filipos era uma colônia romana, e muitos de seus habitantes eram cidadãos romanos, mas será que Paulo está falando desta cidadania? Certamente que não. Ele fala de uma cidadania digna do evangelho de Cristo, e em seguida Paulo fala sobre a unidade da igreja e a luta pela fé evangélica, portanto tal cidadania tem a ver com o fato dos cristãos serem cidadãos do reino dos céus, e não dos reinos aqui da terra.

Nesta mesma epístola, Paulo confirma que sua referência a cidadania do cristão não diz respeito aos reinos deste mundo, às pátrias natais de cada irmão, mas como Paulo diz: “A nossa cidadania (ou a 'nossa pátria', conforme trazem algumas versões), está nos céus, de onde esperamos ansiosamente um Salvador, o Senhor Jesus Cristo” (Fp 3.20). E esta afirmação de Paulo está em conformidade com os ensinos de Cristo, quando em João 17.14 e 16, afirma que seus discípulos “não são do mundo, como ele também não é”. Sendo isto que precisamos ter em mente quando Jesus nos exorta em Mateus 6.33: “buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.”

Eis aqui um erro a ser denunciado, o cristão antes de ser brasileiro, norte americano, espanhol, português, boliviano, argentino, coreano, angolano, japonês, chinês, inglês etc., é um cidadão do reino dos céus, cujo rei é Cristo, Senhor de toda terra. Os primeiros cristãos, inclusive, não chamavam o imperador romano César, de Senhor (Κύριος), pois apenas Cristo tem o direito de ser chamado de Senhor, e por isso muitas vezes os cristãos foram considerados rebeldes (cf. 1 Pe 2.11-25).

Desta forma, o erro que precisamos denunciar, que é muito comum na igreja de nossos dias, é o erro de esquecer de nossa cidadania celestial, tentando assim, enquadrar o cristianismo em espectros políticos humanos. Timothy Keller, pastor presbiteriano norte americano, aponta para este erro ao dizer que o “evangelho de Jesus não é nem de direita, nem de esquerda”, e podemos acrescentar que muito menos de centro. E então, Keller aponta para a idolatria em confiar em partidos ou sistemas humanos, quando diz:a história moderna está repleta de pessoas desiludidas, pessoas que achavam que o capitalismo ou que o socialismo faria de nós pessoas melhores. O pecado que está no coração do homem apenas se expressa de forma diferente em cada um desses dois sistemas.

De forma semelhante, Brennan Manning, autor do célebre livro “O evangelho Maltrapilho”, afirma em seu livro “O Impostor que vive em mim”, o seguinte:

 

A moralidade "vale-tudo" de religiosos e políticos de esquerda é equivalente ao moralismo santarrão da direita. A aceitação não crítica de qualquer uma das linhas partidárias é uma abdicação idólatra à essência da identidade como filho de Deus. Nem o pó mágico liberal nem o jogo pesado dos conservadores se referem à dignidade humana, que sempre está vestida com farrapos. [...] Os filhos de Deus encontram uma terceira opção. São guiados pela Palavra de Deus e apenas por ela. Todos os sistemas religiosos e políticos, tanto de direita quanto de esquerda, são obras de seres humanos. Os filhos de Deus não venderão seus direitos à primogenitura por nenhum prato de ensopado, seja conservador ou liberal. Eles se apegam à liberdade em Cristo para viver o evangelho não contaminados pela má qualidade cultural, pelos destroços de naufrágio político e pelas hipocrisias filigranadas das bravatas religiosas.

 

Voltemos ao texto de Filipenses 1.27-28, nele temos três ensinos de Paulo à igreja, que são: (1) exercer a cidadania de forma digna do evangelho; (2) estar firmados em um só espírito, isto é, estar em verdadeira união; (3) lutar juntamente com outros irmãos pela fé evangélica, sem ser intimidado pelos adversários. Observem que, segundo Paulo neste texto, o cristão exerce sua cidadania como cidadão do reino dos céus, quando se preocupa com a unidade da igreja e com a luta pela fé evangélica em comunhão com outros cristãos, e isso com ousadia, sem ser intimidado pela perseguição. Logo, promover divisões na igreja por causa de política, partidos, polarização ou posições políticas conforme a filosofia de homens, não é exercer a cidadania cristã verdadeira, mas é apenas seguir o espírito deste mundo idólatra e pernicioso, que será destruído pela justiça de Deus (cf. 2 Pe 3.7-13; 1 Jo 2.15).

Paulo traz essa exortação da unidade aqui, pois havia uma dissensão na igreja de Filipos. Um dos problemas envolvia duas mulheres, Evódia e Síntique, que não estavam se entendendo (cf. Fp 4.2). A expressão que Paulo usa, traduzida como “lutando juntos”, dá origem à palavra “atletismo”, referindo-se assim ao trabalho em equipe, para conquistar a vitória. E esta luta, que Paulo se refere, não é por questões terrenas passageiras, mas é a luta pela fé evangélica, isto é, a luta pela propagação do evangelho de Cristo Jesus, o único que pode salvar o homem da morte eterna.

Por isso que precisamos não nos intimidar com os adversários, pois estes veem apenas as coisas finitas, passageiras, nós vemos, em Cristo, o que é eterno. Para eles falar sobre fé, sobre Cristo, é loucura, prova de perdição, mas para nós é a única salvação do homem, pois é a única salvação que vem de Deus, e não do homem. Como Jesus mesmo diz, que adianta ao homem ganhar o mundo e perder a sua alma” (cf. Mt 16.21-28).

Quero finalizar com mais uma citação do Timothy Keller, ele diz:

 

Aqueles que não estão seguros em Cristo se lançam à procura de meios nos quais tentam preservar a vida espiritual e sustentar sua confiança, e em sua busca frenética se agarram não apenas aos farrapos de capacidade e justiça que encontram em si mesmos, mas também se apegam à raça, à filiação a um partido, aos padrões sociais e eclesiásticos e à cultura como formas de autorrecomendação.

 

Meu querido irmão não se apegue a farrapos! Não é uma filiação partidária ou um padrão social humano que te dará verdadeira identidade, mas Cristo Jesus! Você é um cidadão dos céus, busque então, em primeiro lugar o reino de Deus e sua justiça! Promova a unidade da igreja e lute, unido aos outros cristãos, pela fé evangélica, pois é a única redenção que tem o homem de seus pecados! Por fim, não se intimide com as perseguições, pois “se Deus é por nós, quem será contra nós?” (cf. Rm 8.31-39). Que Deus nos abençoe no exercício de nossa cidadania cristã!



[1] STRONG, James. Concordância exaustiva da bíblia. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil. 2002.

 


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